quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Estava

E era tudo tão perfeito. Mas eu queria que o tempo passasse o mais rápido o possível. Pensava que o tempo traria experiências mais felizes. Coisas para contar para os meus netos. Eu pensava que o tempo traria tudo para mim. Noites jogadas fora com os amigos, músicas cantadas no chuveiro, um beijo desesperado, uma família feliz, filhos perfeitos. Tudo isso deveria vir no pacote Vida. 
Ao invés disso, me acomodei. Esperei as coisas virem até mim enquanto ficava sentado. Olhando. Encarando. Não percebi as opções se esvaindo na minha frente. Tinha tudo em mãos para trazer para mim tudo o que eu queria, mas eu não via as coisas com essa clareza.
De repente estava na minha formatura do Ensino Médio, e a única coisa que podia chamar de minha era o meu cachorro. O suor passava pela minha testa com o peso de um milhão de pedras atingindo meu inconsciente. 
Eu não sabia mais o que seria de mim.
Encarar o nada não era mais opção, e todos ao meu redor pareciam saber disso. A pressão que meus pais colocavam sobre mim era nada comparado ao choro da minha mente sobre o quanto eu havia fracassado. Não conseguia mais ver nada claro para o meu futuro. Cheguei em um ponto crítico em que me pegava olhando no dicionário o que era "futuro". Sair de casa era um movimento forçado pela necessidade. Sentar em um banco perder tempo. Qualquer coisa. Mas nada mais me distraía. Todos me diziam que haviam me perdido, quando na verdade, nunca me tiveram. Consegui um emprego. Resolvi dar tudo de mim ali. Me fazer crescer, subir. Casei. Mas toda aquela melancolia não saiu de mim. Muito bem escondida, mas nunca fora de mim. As coisas foram se arrumando, mas não do jeito que eu queria. As coisas pareciam dar certo só para os outros. 
Vieram mais de mim. Mas não exatamente de mim. Aquilo pareceu me encher de esperança no começo. Ver que poderia fazer alguém, extremamente dependente de mim, ser melhor do que eu. Era assim que eu pensava até ver que isso se tornou verdade. A convivência com alguém que fazia o que eu fazia, mas melhor do que eu, se tornou insuportável. As coisas começaram e decair interiormente para mim. Voltei a época do confinamento. Me isolava do mundo pela antipatia. Tudo parecia me decepcionar. Tudo que um dia havia me dado conforto pelos instantes sem sentir a tristeza imensa invadindo meus pulmões, e a pesada máscara que a cobria.
Eles erravam. Eu esquecera que eles eram humanos. Humanos. Eu também era. Mas ninguém se preocupou em me contar esse detalhe. 
E tudo isso foi silenciado por uma bala na minha cabeça.
terça-feira, 2 de novembro de 2010

Entrelinhas

Mentir já era um habito. Já não chamava mais de mentira. Dizia para si que ocultava os fatos.

- Tudo bem?
 (Não. Eu virei um monstro. Eu não consigo amar alguém. Eu faço as pessoas gostarem de mim e depois eu deixo elas. Sempre. Ninguém entende isso. Isso é pior do que amar alguém com todas as suas forças. Você não conseguir amar alguém é como se seu coração tivesse sido arrancado, ou sequer você tivesse nascido com ele. Eu consigo o que eu quero e depois não quero nunca mais).
- Tudo.
- Novidades?
(Eu fiz de novo. Eu sempre faço. Eu menti. Eu magoei alguém por medo de magoar. Eu nunca saio magoada). 
- Nada novo, só as mesmas coisas de sempre.
(É, isso até que não é mentira. Eu sempre tratei os outros assim. Como se eu ligasse de verdade para eles. Queria eu conseguir. Eu não me importaria de ter o coração esfaqueado se ao menos eu tivesse um coração). 
- Continue assim, se isso te faz feliz.
(Não me faz feliz. Mas eu não consigo mudar isso).
 

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